Uma farsa moderna
David Cronenberg habitou-nos aos seus devaneios/fábulas/sonhos, numa sucessão de temas mais ou menos emergentes ou previstos, com a precisão de um artesão e a antevisão de um homem à frente do seu tempo.
History of Violence é talvez o mais realista dos seus filmes. E realista no sentido de real. Passa-se numa pequena cidade norte-americana e à volta de uma vulgar família. Podia ser qualquer uma das muitas povoações que quase tomamos como nossas, tal o nível de contaminação do nosso imaginário cultural pela vivência vista, contada ou ouvida dessa Terra dos Sonhos, que para mim mais se assemelha à Terra das Ilusões.
Voltando ao filme, o enredo passa-se em volta dos Stall. Pai, mãe, filho adolescente e filha criança. Mas logo de início percebemos que aquela não é apenas a história daquela família ou daquele lugar. O filme baseia-se na simples proposição de que quando somos obrigados a isso, qualquer um de nós pode ceder a esse instinto animal que milhares e milhares de anos de herança não nos tem ajudado a superar mas sim a reinventar. E que por muito que tentemos é impossível fugir.
A fatalidade é usada como uma farsa, para nos fazer ver, como se de um espelho se tratasse, que ainda somos esse animal selvagem que tudo faz para sobreviver. Mudem-se os nomes, pintem-se os cenários, enfeitem-se as armas. Não, o Mundo não está menos violento do que tem sido desde que nos vemos como Humanidade.